04.01.13

ENOLOGIA DIABÓLICA \ A lenda do Casillero del Diablo

Fernando Pessoa escreveu certa vez: “Boa é a vida, mas melhor é o vinho.” Nunca entendi direito a citação, como é que alguma coisa pode ser melhor que a vida, que, até onde sei, engloba tudo? Também não sou um profundo entendedor de vinhos. Não chego nem perto de ser um mediano entendedor de vinhos. Na verdade, não entendo bulhufas de nada, nem de vinhos, nem de poesia sobre vinhos. Mas gosto de apreciar um bom tinto de vez em quando, partindo do princípio que não é preciso entender para gostar de alguma coisa. Digo tudo isso porque tenho o meu vinho preferido, o lendário Casillero del Diablo. Lendário porque tem uma história bastante interessante por trás dele, e é disso que eu vim falar aqui.

Visitei o Chile em julho de 2012. Queria conhecer o país de Pinochet, Neruda e Valdívia por inúmeros motivos, e o que não falta naquele hospitaleiro país são motivos para conhecê-lo. Apesar do seu peculiar território de 150 quilômetros de largura por 4.300 de comprimento, é possível encontrar de tudo naquele pedaço de mundo: praias, neve, deserto, tsunami, vulcão, terremoto, favela, brasileiros inconvenientes e, claro, vinhos. O próprio Casillero del Diablo é um dos muitos patrimônios daquele simpático e incrivelmente estreito país. Como nunca havia estado em uma vinícola antes, suspeitei que conhecer Concha y Toro poderia me deixar um pouco menos ignorante em enologia.

Homens são como um bom vinho. Todos começam como uvas, e é dever da mulher pisoteá-los e mantê-los no escuro até que amadureçam e se tornem uma boa companhia para o jantar.

Por possuir algumas das melhores condições climáticas e geográficas do mundo, o Chile é o lugar perfeito para uma iniciação ao deslumbrante mundo dos vinhos. Assim que coloquei os pés naquele lugar eu percebi o quanto precisava aprender. Concha y Toro, que foi fundada em 1883 por Don Melchor de Concha y Toro, é a maior e mais badalada vinícola do Chile, exportando seu precioso líquido para mais de 100 países. Seu carro-chefe não poderia deixar de ser o Casillero del Diablo, que tem esse nome por causa de uma lenda iniciada em 1891. Segundo pregam os sommeliers que que guiam os visitantes pela imponente vinícola, o próprio Diabo habitava a adega de Don Melchor para degustar alguns de seus melhores rótulos. Como disse, é uma lenda.

Satanás?! É você, Satanás?

Verdade ou não, turistas do mundo inteiro vão a vinícola para certificar-se da presença in loco do mal encarnado. Os marqueteiros da casa, malditos que são, aproveitaram-se disso e criaram toda uma atmosfera sombria ao lugar. “Venha viver a lenda”, é o que sê lê em seus cartazes publicitários. Mas depois que fui viver a tal lenda, acho que deviam mudar a chamada para “Venha se borrar”. O sujeito está lá caminhando entre os toneis e barris de madeira no subsolo da vinícola e então… zapt. Você jura ter visto um vulto passando em algum lugar. O ‘coisa ruim’, provavelmente. Crianças e adultos entregam-se ao medo, imaginando que a lenda tenha seu fundo de verdade. Céticos e destemidos fingem que não viram nada. Eu apenas tirava fotos e pensava: ainda escreverei sobre isso.

Também tem uma versão bem menos enfeitada onde Don Melchor teria inventado a história para manter ladrões e saqueadores bem longe do lugar. Ou então ele imaginava que algum dia aquilo atrairia turistas que visitavam o Vale Central. De qualquer forma, são hipóteses mais confortantes caso aviste a sombra do capeta numa parede. Impossível não sentir um frio na espinha em algum momento, por mais teatral que aquilo possa parecer.

Mas, voltado ao vinho. Retornei de Santiago um pouco menos tolo e apreciando ainda mais o Casillero del Diablo. Acho que me rendi à lenda. Pelo menos agora eu sei que, por se tratar de um vinho forte, ele sugere pratos igualmente fortes, como carnes vermelhas ou qualquer coisa bem condimentada. Li em algum lugar que a safra de 2007 é especialmente admirada pelo mais entendidos. Se é que posso dar algum crédito aos mais entendidos, por mais que eu me esforce ainda não sou capaz de sentir a textura amadeirada e levemente aveludada em um maldito gole de vinho.

14 Responses to A lenda do Casillero del Diablo


    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

      Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

    Warning: call_user_func(twentyten_comment) [function.call-user-func]: First argument is expected to be a valid callback in /home/verbos/public_html/wp-includes/comment-template.php on line 1336

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *

*

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <strike> <strong>

O verbo desenvolver é especialidade da Webcomtexto

wct